O ESPONTANEÍSMO DAS MASSAS E AS DIREÇÕES DOS MOVIMENTOS

Cada vez mais, na esquerda, percebemos um posicionamento aparentemente democrático e avançado: as direções, seja de sindicatos, partidos, movimentos sociais como um todo, abstêm-se de dirigir. Temendo afastar-se das massas deixam que elas ditem o caminho. Mas o que isso acarreta? Como que algo assim pode ser nocivo a luta das categorias e da totalidade do proletariado? Esse é o papel das direções?

Sob o argumento de ouvir as bases, para representá-las com justiça, as direções de diferente esferas dos movimentos sociais têm, no Brasil, “aberto mão” de Palavras de Ordem e de discussões que levariam à imprescindível politização das massas.

Há pouco vimos o exemplo de Marcelo Freixo, deputado federal do PSOL, afirmando impossibilidade de defender a Palavra de Ordem “Lula Livre!”, apontada por nós do PRC, pois, segundo ele, ela não unifica. A mesma postura foi vista no X Congresso do CPERS/SINDICATO (Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul – Sindicato dos Trabalhadores em Educação, segundo maior sindicato da América Latina, com cerca de 80 mil sócios). Diante da defesa de se aprovar como deliberação a Palavra de Ordem “Lula Livre!”, houve a rejeição do plenário, sob orientação de grande parte da direção deste sindicato, utilizando-se do mesmo argumento, de que a pauta “Lula Livre!” não unifica a categoria. Cabe aqui salientar que a presidente deste sindicato, que defendeu a derrota da referida Palavra de Ordem, é militante do PT e a vice-presidente deste sindicato, que também apoiou a derrota desta pauta, é do PCdoB.

Da mesma forma ocorre com a resistência de setores dirigentes da esquerda à Palavra de Ordem “Fora Bolsonaro!”, embora que, por trás desta discussão é possível perceber não só a influência da despolitização, mas de outras questões importantes de se destacar.

Está muito presente nas falas daqueles que são contrários ao “Fora Bolsonaro!” o argumento de que derrubando-se Jair Bolsonaro colocaria-se seu vice, o General Mourão no governo. Afirmam que a presidência com Bolsonaro seria melhor que um governo sob o comando de Mourão, . Parece surreal este argumento ao olharmos para tudo que tem acontecido no Brasil. Os avanços dos ataques encaminhados por Bolsonaro, como a reforma trabalhista, a reforma da previdência, o arrocho do salário mínimo, o enfraquecimento e a destruição dos sindicatos, a destruição de nossa soberania, de nossas riquezas naturais etc. têm sido a tônica deste governo, com uma resistência que está longe de conseguir dar um basta ou mesmo de impôr algum revés ao projeto em curso.

Estes setores de direções dos movimentos sociais que rejeitam a Palavra de Ordem “Fora Bolsonaro!” afirmam que o atual presidente golpista seria menos capaz de implementar o fascismo e os ataques ao proletariado, exigidos pelo imperialismo. É importante destacar que o projeto fascista e os ataques aos direitos se aprofundam em grande velocidade sobre a tutela do atual governo, pois isso torna claro que não faz o menor sentido temer o sucesso de um governo Mourão, já que o sucesso do projeto político e econômico de Mourão tem se dado com o governo Bolsonaro e negar isso é fechar os olhos para todos os retrocessos implementado por este governo.

O argumento de que não derrubar Bolsonaro do governo é um método eficaz de combate o fascismo (pois alguns argumentam isso: “se entrar o Mourão aí sim viveremos sobre a tutela do fascismo”), parece até brincadeira de mau gosto. Mais uma vez é preciso perceber o quão trágico têm sido para o proletariado estes 9 meses do atual governo, tanto no que tange direitos político e econômicos, quanto no que tange ao cerceamento das ferramentas de lutas da classe operária (ataques a sindicatos, a partidos políticos com a criminalização direta e indireta, utilizando-se em não poucos casos das forças armadas institucionais e das paramilitares).

É algo mecânico e um desprezo à dialética afirmar que se derrubar Bolsonaro, Mourão assumiria com toda tranquilidade e normalidade política. Ignora-se, neste caso, o quanto a queda de Bolsonaro pela pressão popular seria instrutiva às massas. Oportunizaria ao proletariado a compreensão do seu poder de interferir na realidade, e a possibilidade do protagonismo que podem e devem assumir nos rumos da luta de classes no Brasil. Como disse Marx na carta à Wilhelm Bracke de 1875:“cada passo do movimento real vale mais que uma duzia de programas”

Logo, derrubar Bolsonaro com a mobilização do povo nas ruas, além de implementar uma dura derrota ao projeto imperialista, fascista e golpista no Brasil e na América Latina, criaria um novo quadro em que certamente o avanço destes ataques em curso de forma quase natural, tenderia a enfrentar uma maior dificuldade, com uma consciência das massas mais elevada e mais motivada. A resistência avançaria, assim como a possibilidade de se construir um novo patamar de luta, ou seja, não só de resistência, mas de transformação. Contribuindo assim, diretamente, para uma elevação da consciência, a tal ponto que traria, para os dias de hoje, o horizonte da revolução.

Feitas estas ponderações, concluímos que o fato de negar a Palavra de Ordem “Fora Bolsonaro!” demonstra, em alguns casos, a aposta mais uma vez na despolitização e no espontaneísmo, e em outros, o medo, a covardia de investir na luta real das massas. Também traz a tona a ideia de que com Bolsonaro está ruim, mas pode piorar. Uma posição que além de covarde traz consigo uma essência reacionária, pequeno burguesa. Em outras palavras, expressam o descaso com o proletariado, que vem enfrentando a fome, a morte, o genocídio diário, dificuldades cada vez mais extenuantes, consequências deste governo. Como se o que está ocorrendo hoje fosse ruim, mas não tanto. O atual governo já tem comprovado a veracidade do dito popular “nada é tão ruim que não possa piorar”, pois diariamente piora as condições do proletariado.

As mesmas questões e confusões têm sido vistas quando se tratam das táticas de luta. O momento adverso do quadro atual, com o fortalecimento do imperialismo, sob a égide do fascismo, tem colocado o proletariado em situação cada vez mais complicada. Com perdas de direitos, de conquistas,. O proletariado está mais do que nunca alijado de opinar, de resistir, sendo colocado “nas cordas” diante de tantos ataques.

De dirigentes ouve-se a afirmativa da impossibilidade de chamar o povo para as ruas para enfrentar o fascismo porque, segundo eles, o povo não vem. Afirma-se que nesta ou naquela categoria, não se pode indicar uma paralisação, uma greve, porque não haverá adesão. E com esta desculpa de “democraticamente” ouvir as massas, se abstêm de apontar a luta, de construí-la, de debatê-la, pois isso geraria um “desconforto coletivo”. Segundo estes dirigentes, as massas repudiam qualquer tipo de movimento de resistência, ou porque estão cansadas, ou porque as veem como partidarização, ou por qualquer outra desculpa que jogue a responsabilidade da inércia sobre elas.

Esta confusão se consolida com o comportamento das direções de “democraticamente” não politizar as massas para não perdê-las. Na política não existe espaços vazios e quando as esquerdas tomam a atitude de não politizar, contribuem diretamente para que as massas assumam posicionamentos antiproletários e fascistas. Como afirmou Lênin no livro “O que fazer?”: “toda diminuição da ideologia socialista, todo distanciamento dela implica o fortalecimento da ideologia burguesa”. Em outras palavras, setores da esquerda, dos movimentos sociais, mesmo que inconscientemente, ou não, têm responsabilidade direta no fortalecimento de ideais fascistas no meio das massas, têm responsabilidade direta nos posicionamentos assumidos por parcelas das massas que criminalizam a esquerda, que criminalizam os sindicatos, as greves, as paralisações, as lutas…

Nós comunistas defendemos a unidade. Temos a clareza que a unidade do proletariado e de setores mais amplos, progressistas, democratas, antifascistas, é imprescindível para o avanço da resistência da classe operária. Mas, ao mesmo tempo, sabemos a importância de que esta unidade se dê sobre o jugo da consciência, da politização. Caso contrário, esta dita unidade pode estar a serviço de nossos algozes, pode estar a serviço do fascismo. A unidade e a amplitude são indispensáveis. Mas elas têm que estar a serviço da classe operária, precisam contribuir com o avanço da luta proletária e isso só é possível sob a politização.

Uma unidade que não se disponha a enfrentar o fascismo, o imperialismo, que não se proponha a defender as liberdades de forma real e concreta, que não se disponha a defender as organizações de esquerda, a reconhecer na burguesia, no imperialismo, no fascismo seus inimigos, é uma unidade fajuta, uma unidade de forma, mas não de essência. É uma unidade que certamente não terá a mínima força de superar as agressões impostas pela burguesia e seu sistema, que ficará refém da burguesia e, não raras vezes, verá em seus inimigos, equivocadamente, seus heróis.

Abrir mão da consciência, da politização das massas em um quadro tão adverso quanto esse que vivemos, é contribuir de forma dura e decisiva a favor da burguesia, do fascismo, do imperialismo, do capitalismo… É jogar contra o proletariado, contra sua luta de resistência, contra o avanço revolucionário de nossa luta.

Certamente a história cobrará destes que hoje, conscientemente ou inconscientemente jogam em nossas trincheiras a favor do fascismo. Mas isso não basta. Precisamos ter a audácia e a coragem de politizar as massas. Precisamos romper com a concepção que vá a reboque do espontaneísmo, pois se assim não o fizermos, inviabilizamos a luta de resistência e a luta revolucionária.

– Em defesa da politização:

Frente ampla contra o fascismo!

Lula Livre!

Fora Bolsonaro!

Viva a Revolução Socialista!

Everton Barboza

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