Balanço da Conferência PCPB-LC

1-Entre os dias 9 e 11 de setembro foi realizada em São Paulo uma Conferência entre a Liga Comunista (LC) e o Partido Comunista do Povo Brasileiro (PCPB) para dar início ao processo de fusão entre as duas organizações e projetar uma nova organização marxista no país. Reuniram-se trabalhadores comunistas de vários estados do país, Pernambuco, Espírito Santo, São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, de várias categorias: pintores, marceneiros, operários da construção civil, radialistas, professores, funcionários públicos, trabalhadores da saúde e da alimentação, sindicalistas, aposentados.

2-A Conferência se justifica como uma reação necessária para a superação programática e organizativa das principais questões do marxismo em nosso tempo. Nosso período histórico é marcado pelo refluxo das lutas revolucionárias. A última revolução que expropriou a burguesia como classe e derrotou o imperialismo foi a vietnamita em 1975. De lá para cá, a iniciativa tem ficado nas mãos do imperialismo e do capital, com a financeirização e o neoliberalismo contra as condições de vida do proletariado. Em termos gerais, como parte desse processo, ocorreu um retrocesso da consciência de classe, marcado pela ofensiva anticomunista fortalecida pela contrarrevolução social na URSS e no Leste Europeu há mais de 30 anos. Ainda que tenham ocorridas importantes lutas proletárias e enormes greves gerais, no Brasil (2017), no Chile (2019), na Índia (2020) e os maiores protestos da história dos EUA contra a brutalidade policial imperialista (2020), a carência de um novo ascenso revolucionário do proletariado conduziu a uma reversão do retrocesso ideológico e organizativo do proletariado mundial. A hegemonia do capital financeiro somada à pauperização da pequena burguesia e do proletariado fomentaram a ascensão de novos fenômenos da extrema direita e do fascismo.

3-Sob uma crise histórica de direção revolucionária ocorreu um decrescimento em qualidade e quantidade de agrupamentos que reivindicam o marxismo revolucionário, diminuição do número de membros dos agrupamentos existentes. Quando as organizações mais se fracionam do que se fundem, o encontro LC-PCPB reage como expressão da contradição em relação a todas essas tendências, compreendendo que por mais heroicas e massivos que possam ser as lutas proletárias e dos oprimidos em geral, sem teoria revolucionária não há movimento revolucionário.

4-A Conferência diz um basta para a fragmentação dos comunistas da qual tem se alimentado o fortalecimento dos fascistas, neoliberais e oportunistas. O encontro é também é inédito pelas distâncias que marcam as origens históricas das duas organizações, nos ramos do trotskismo e do stalinismo. É muito singular nesse processo político a possiblidade de organizar um projeto organizativo que supere a trajetória liquidacionista tanto do stalinismo quanto do trotskismo (em todas suas respectivas variantes) e supere os vícios oportunistas e sectários que conduziram à situação atual.

5-A Conferência é consequência de vários meses de aproximação entre ambas na análise política da conjuntura internacional e nacional. A partir da Guerra na Ucrânia, acontecimento central da conjuntura mundial e divisor de águas na esquerda. A LC e o PCPB têm realizado atividades conjuntas e públicas e construído acordos em documentos como o “Abaixo a Guerra imperialista por procuração da OTAN na Ucrânia! Pelo direito da Rússia a se defender contra a invasão imperialista! ”, uma declaração internacional de primeiro de maio, assinada por 24 organizações e dezenas de ativistas distribuídos por 14 países.

6-A coincidência na avaliação da conjuntura internacional é, para os internacionalistas, a base de grande parte das coincidências na conjuntura nacional. Isso fez com que um dos momentos de destaque na Conferência fosse o painel “200 dias de Guerra: Pare a Guerra dos EUA/OTAN contra a Rússia e os preparativos de guerra contra a China! ” do qual participaram o PCPB e a LC, pelo Brasil, dentre organizações representantes de cinco continentes.

7-Ambas as organizações coincidem que estamos diante de uma nova situação internacional aberta com o declínio do imperialismo dos EUA e ascensão da China e da Rússia. Essa nova situação de desagregação da ordem imperialista dominante poderá abrir em médio prazo uma “janela revolucionária” (nas palavras do PCPB) ou favorecer o surgimento de uma “quarta onda revolucionária” (elaboração da LC-TMB). Situação que provoca também a reorganização internacional do movimento comunista, tendência anti-imperialista e socialista da qual o movimento de fusão entre LC e PCPB faz parte.

8-A Tendência Militante Bolchevique (TMB), organização argentina irmã da LC e membro do Comitê de Ligação pela IV Internacional, participou integralmente do fórum, oferecendo uma contribuição fundamental em todo esse processo de construção organizativa e programática. Na abertura, da Conferência estiveram presentes o PCO e o CCR, que saudaram a atividade e a consideraram positiva em que pesem as diferenças que essas organizações possuem com as organizações conferencistas. A Iniciativa Comunista não compareceu, mas enviou a saudação reproduzida abaixo.

9-No campo conjuntura nacional, ambas as organizações coincidem com a tática do chamado a votar em Lula como instrumento político para derrotar eleitoralmente Bolsonaro e criar condições mais favoráveis e contraditórias para a retomada do movimento de ascenso proletário e para a ação revolucionária sobre a luta de classes. Ao mesmo tempo criticamos a política de frente ampla e de colaboração de classes do PT, PCdoB e PSOL, que poderá nos conduzir a uma derrota igual ou pior a do golpe de 2016, levando a mais profunda desmoralização política, arrastando consigo também a autoridade política de Lula, esperança da população trabalhadora, e reabilitando o bolsonarismo.

10-Para qualquer das variáveis desse processo conjuntural, qualquer que seja o futuro governo, é preciso construir um novo partido operário e revolucionário. Um partido que não tenha vacilado diante do golpismo e do imperialismo, como fizeram todos os componentes da chamada frente de esquerda e seus satélites que defenderam abertamente ou flertaram com as políticas imperialistas do golpe de Estado e do lawfare em nome do combate a degeneração do petismo. Um partido que tenha conquistado a autoridade de acompanhar a evolução da consciência das massas à esquerda contra o bolsonarismo e não vacilar novamente criando ficções sectárias e filoanarquistas (candidaturas de propaganda ou voto nulo) diante da disputa entre Lula e Bolsonaro. Também é necessário criar um novo programa de reindustrialização, desenvolvimento científico e tecnológico, libertação e defesa da soberania nacional condicionados a luta anti-imperialista, contra o latifúndio e pela emancipação dos explorados em relação ao conjunto do capital. A luta pela conquista revolucionária do poder político pela classe trabalhadora deve se debruçar sobre o entendimento da dinâmica histórica e social da formação do Brasil, da marca do escravismo colonial que determinaram o atual capitalismo semicolonial, vassalo da decadência rentista imperialista.

11-Se hoje LC e PCPB apoiam tática e criticamente a Lula contra o fascismo, e a Putin e Xi Jimping contra o imperialismo é porque o proletariado carece de um instrumento próprio, para a defesa dos seus interesses imediatos e mais ainda históricos, tanto no plano nacional quanto internacional, o que entendemos ser uma seção brasileira de um partido mundial da revolução socialista.

12-Embora não descartem a necessidade de que um partido leninista deva disputar a luta no terreno das eleições burguesas, PCPB e LC não aspiram jogar esforços imediatos para a legalização de uma legenda eleitoral. Por outro lado, a Conferência indicou a construção de uma delegação com tese própria da nova organização que está sendo criada para o próximo Congresso da Central Única dos Trabalhadores. LC e PCPB lutam por construir Comitês Populares desde muitos antes das eleições contra o regime golpista, mas, sobretudo após essas eleições em cada local de trabalho, moradia e estudo para defender os interesses da classe trabalhadora.

13-No campo programático, vários documentos estão sendo apresentados pelas organizações como contribuição ao processo de fusão que que teve início na Conferência. O PCPB apresentou para o debate o documento impresso “Manifesto Programa à Revolução Brasileira”. A LC apresentou o: “Balanço do Trotskismo e Fundamentos do Programa CLQI para um Programa Comunista e Revolucionário no Século XXI”. No campo teórico, os conferencistas defendem o método do materialismo histórico e dialético, sendo  deliberado a realização de uma escola de quadros de formação continuada e a criação de uma revista teórica.

14-Os órgãos de agitação e propaganda e na luta ideológica das duas organizações (jornais impressos, revistas, sites, blogs, plataformas de compartilhamento de vídeos) passarão a compartilhar artigos e documentos. As divergências políticas entre as duas organizações poderão ser públicas, seguindo a saudável tradição bolchevique antes de sua stalinização, durante os primeiros anos do processo revolucionário, da guerra civil e da consolidação do poder soviético.

15-Superando positiva e criticamente as velhas querelas sectárias entre o stalinismo e o trotskismo e suas várias matizes, tendências que alimentaram e seguem alimentando dogmas e preconceitos mútuos dentro do movimento comunista há um século, ambas as organizações coincidem com a luta pela construção do partido leninista baseado em células e no centralismo democrático; com a crítica à política estratégica stalinista das Frentes Populares de Dimitrov e do “socialismo em um só país”, coincidem com o internacionalismo proletário contra o imperialismo e a burocratização dos processos revolucionários, com a luta pela Revolução Permanente, pela revolução socialista para a tomada do poder pelos trabalhadores, pela ditadura do proletariado.

16-Nos debates que se sucederam a Conferência reconheceu que reuniu pequenas organizações comunistas que ousam assumir compromissos pela criação de uma nova organização para a luta teórica, política e econômica da classe trabalhadora para uma profunda transformação revolucionária em âmbito nacional e internacional. Ao mesmo tempo, a Conferência pergunta qual organização que se reivindica comunista no Brasil hoje exerce ou exerceu alguma influência na luta de classes das massas na última década. Pior ainda se for levado em conta o papel prejudicial que a quase totalidade das existentes exerceu em favor do Golpe de Estado de 2016 e agora nas eleições de 2022. Sendo assim, os conferencistas: 1) não se auto proclamam os únicos e verdadeiros comunistas do país capazes de realizar sozinhos as tarefas de organização que o proletariado atual precisa; 2) não estimulam o fracionismo sectário entre comunistas; 3) acreditam na evolução programática através da crítica e autocritica marxistas, tentativa e erro e, 4) se dispõem honestamente e com todas as suas forças a superar a fragmentação atual, tão benéfica aos nossos inimigos de classe, ao fascismo e ao imperialismo.

17-A Conferência abriu a possibilidade para o estreitamento de relações com outras organizações e militantes comunistas que busquem os mesmos objetivos estratégicos que seus participantes, ainda que possam ter diferenças táticas conjunturais com os conferencistas, e faz um chamado a construção de uma organização em um nível superior para influência e determinação na luta de classes. Para tanto, serão realizadas reuniões presenciais e abertas. A revista teórica, nesse sentido com os agrupamentos e militantes interessados e a Conferência deu início ao processo de construção de um Congresso Nacional para a criação da nova organização.

Abaixo o Imperialismo

Fora Bolsonaro

Lula Presidente

Viva a Unidade dos Comunistas Revolucionários!!!

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