Como não se indignar

A frase de Lula sobre o surgimento do Coronavírus, o “ainda bem”, gerou alvoroço nas redes sociais e nos meios de comunicação em geral. Taxada de infeliz por alguns, justificada por outros, a declaração levou o próprio Lula a desculpar-se e serviu de munição para a direita como um todo (desde à extrema direita aos déspotas esclarecidos), trazendo à tona o frágil escamoteamento da luta de classes em nossa sociedade.

A romantização da luta contra a pandemia atual gera teorias mirabolantes sobre o futuro da sociedade. Algumas delas extremamente demagógicas, outras ilusórias e equivocadas e, ainda a incipiente, mas exata, materialista e revolucionária. A visão demagoga é baseada em uma lógica cristã, que defende que na humanidade não há mais espaços para a luta de classes e que é necessária uma “unidade total” para a superarmos a pandemia. Explorados e exploradores abraçados à distância, contra o vírus… Mesmo que o marxismo tenha nos comprovado o caráter irreconciliável dos interesses antagônicos entre exploradores e explorados, mesmo que Paulo Freire, referendando Marx, nos aponte que é possível um diálogo com os diferentes, mas impossível um diálogo com os antagônicos.

A justeza do que nos apontam Marx e Freire fica facilmente perceptível quando os mesmos demagogos que lançam e defendem a tese “unidade entre todos os seres humanos”, desferem duros golpes contra os explorados, seja retirando direitos, seja obrigando-os a trabalhar em meio a pandemia (em uma busca desesperada para salvar os capitalistas). Estes demagogos porém, sempre, de forma indireta ou direta contribuem com o genocídio da classe operária.

Assim, os que partem dessa leitura romântica e ilusória de que sairemos naturalmente melhores, mais humanos e mais fortalecidos, após a pandemia, também desconsideram a luta de classes. Para os adeptos dessa visão, o positivo das crises, das tragédias e mortes, está no evolucionismo Social, no humanismo cristão e na defesa da classe no poder, e não na transformação. O seu naturalismo é indigno e por isso só a indignação pode causar efeito contrário. A indignação de Lula é bem vinda, pois remete a uma dialética, parecida com a música de Geraldo Vandré, utilizada como trilha sonora do filme Bacurau, cuja canção em determinado momento conclama: “se alguém tem que morrer, que seja pra melhor”.

As mortes por Coronavírus, pelas chacinas fascistas (como evidenciadas com o mais recente assassinato do inocente jovem negro João Pedro), pela fome, pelo descaso, pelo preconceito, pela opressão burguesa, não podem ser em vão. Criminoso não é usá-las para conscientizar, para mobilizar, para combater as opressões, para derrubar Bolsonaro, Mourão, Leite, Witzel, Dória, Huck etc. Criminoso é cair na hipocrisia de prestar condolências e resignar-se sem fazer nada que possa contribuir, nem que seja minimamente, para impedir que elas sigam ocorrendo.

Se a responsabilidade direta de toda esta catástrofe é da burguesia, só nos caberia um pedido de desculpas diante da omissão, do medo de lutar e vencer, ou mesmo do receio de ver as massas atuantes e combativas. Não apostar na luta massiva dos proletários em um momento tão sério e tão grave, isso também é crime! Vacilar e não apontar que devemos derrubar Bolsonaro, Mourão e toda sua corja, quando parcela significativa das massas clama pela Palavra de Ordem “Fora Bolsonaro”, isso sim é um grave crime!

Não há a mínima segurança de avanços, do ponto de vista proletário, sem o combate travado por ele mesmo nas ruas. Para tanto, é sempre necessário relembrar Engels quando afirmava, “que a emancipação dos operários deve ser obra dos próprios operários”. Enquanto a derrubada de Bolsonaro estiver nas mãos só da Rede Globo e dos “déspotas esclarecidos”, estaremos fadados ao fracasso. A superação da atual pandemia e do sofrimento da classe operária como um todo vem nesse mesmo sentido. O “Fora Bolsonaro” e as garantias de que as mortes proletárias não serão em vão, só ocorrerão por meio da luta da classe operária.

Que desse “limão” que é a pandemia, saia uma “limonada”. Que as dolorosas perdas de tantas vidas sejam uma alavanca para a consciência de classe do proletariado. Que o luto que nos assombra fortaleça as organizações dispostas às lutas reais (que não caem nas demagogias de um capitalismo sem luta de classes e com uma democracia universal). Em suma, que estas avassaladoras perdas impulsionem a luta que terá como desfecho o fim do descaso com as mortes proletárias de forma concreta. Como Lula, nos indignamos pelo estado Fascista e Neoliberal que tomou o país Além disso, reiteramos a firme posição contra a naturalização da crise, da pandemia e do terror imperialista.

– Aos nossos mortos nenhum minuto de silêncio, mas uma vida inteira de combate!

– Se podemos trabalhar, podemos protestar!

– Ousar lutar, ousar vencer!

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