O Brasil de Lula e o retrocesso diante da luta de classes

Em 2003, quando da primeira eleição de Lula, jamais poderíamos prever que a sua liderança no mundo alcançasse tamanha dimensão. O Brasil tornou-se disputado no cenário internacional, ocupando, em todos os lugares, posição de frente na defesa da autodeterminação dos povos. Na América Latina fez história na construção do Mercosul, no apoio a Cuba, à Venezuela, à Bolívia, à Nicarágua, à Argentina, ao Equador. O Brasil dava provas ao mundo de que era um elo fraco da cadeia imperialista, um país continental que, sob a perspectiva de esquerda, unia o proletariado latino-americano e abria cancelas no resto do mundo.

 

Na tentativa de minar essa liderança, o golpe demandado pelos EUA não tardou, e a exigência de todo o setor de direita e extrema direita se uniu para apagar as memórias de Lula, colocando-o em uma prisão e tratando, na grande mídia, de desmoralizar a sua liderança. É claro que a luta contra o golpe demostrara toda a ilusão do PT e cia nas institucionalidades da burguesia; pareciam que se sentiam em casa no governo ao ponto que nem às véspera do golpe, acreditavam que ele ocorreria. A burguesia demostrou sob suas bases democráticas golpistas como que se “tira o doce de uma criança”. Mas se Temer, em nome da direita, estava encantado pelo governo, a extrema direita buscava além do governo uma base de classe média e proletária, bem como o interesse do capital financeiro imperialista. Casamento perfeito, bolsonarismo e monopólios estrangeiros, o fim da soberania e a entrega de todo o país.

A derrota de Bolsonaro pelos partidos de esquerda e o movimento popular não triunfou através das ruas pelo Fora Bolsonaro. Mais uma vez a esquerda demonstrou pouca iniciativa, capacidade de luta, unidade, força para levar adiante uma luta política de magnitude. Nem uma greve geral foi realizada no período do genocida, no entanto, a torcida organizada dos clubes brasileiros teve que tomar a frente em dado momento para correr das ruas com os fascistas. Enquanto o povo trabalhava, negava-se, por conta da Covid-19, a manifestação de rua. Claramente, grande parcela da esquerda puxava para trás.

A vitória, por fim, deu-se nas urnas. Lula e o povo brasileiro formam os grandes vitoriosos. A liderança de Lula junto ao povo é algo que foge à compreensão tanto da direita como da extrema direita. A estes, foge-lhes o aspecto da classe operária, do proletariado e de sua luta por uma causa histórica. Não entendem como pode, sob o cerco a Cuba resistir 60 anos, dar um golpe militar na Bolívia e o povo nas ruas derrotar os fascistas. Como Lênin e os bolcheviques conseguiram criar a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, como a pequena Coreia do Norte faz o império dos EUA retroceder em muitas de suas decisões. Mesmo Lula não sendo um revolucionário, a liderança que ocupa no povo e sua capacidade de mobilizá-lo é um poder maior que aquele que ele acha que tem como chefe de Estado da burguesia. Neste local, o poder não é dele, é daqueles que lhe deram o golpe, que lhe colocaram na prisão, e até tiraram quando convinha.

Neste terceiro mandato, a burguesia trabalha para pôr fim a um patrimônio que acompanha Lula e que grande prestígio traz à esquerda, que é a mobilização de rua. Acabar com essa mobilização, significa que o único caminho para uma mudança popular mais ou menos profunda estaria amarrada ao parlamento e às instituições do país. A força do povo nas ruas impondo seu poder precisam de Lula, mas como chefe de Estado se comporta agora hipocritamente, colocando ao movimento a força de mobilização. Se não avançarmos, diz muitas vezes Lula, é porque vocês não souberam cobrar o suficiente com o movimento de protesto.

Ora, Lula tem sua parcela subscrita na fusão com o povo, na liderança adquirida, porém, ele é também produto de toda a luta de esquerda na defesa do proletariado, um caminho se efetivado entre a luta teórica e prática no enfrentamento contra a direita e a extrema direita historicamente travado no Brasil. Passar para o lado da ditadura do Estado burguês e se comportar como distante da luta que efetivamente pode promover mudanças de fundo, é se comportar como um reacionário que diz: “Essa luta é de vocês”. Se querem reverte a reforma trabalhista, previdenciária, do Novo Ensino Médio, das privatizações, etc., se organizem e lutem, o meu negócio é administrar o Estado burguês e fazer com que ele possa pelo menos, em tempo do meu mandato, proporcionar o mínimo de três refeições diárias para quem não tem. Esse é o meu compromisso.

A recusa de colocar como iniciativa sua as grandes tarefas de luta proletária do país, tal qual a retomada da estatização do petróleo, da Eletrobrás, de realizar a reforma agrária com intuito de quebrar com o poder político do agronegócio, que o mesmo Lula chamou de fascistas, e que avance no rumo soberano, desconstituindo o poder atual dos generais golpistas que servem ao intento dos ianques, tal qual o monopólio da mídia e da justiça como um império intocável, não só é vergonhoso e reacionário, mas é coroar o seu próprio fim, e do próprio PT, onde a burguesia com o golpe tentou acabar com esse partido e a liderança, mas não conseguiu. Deixar que agora, ante as novas possibilidades da luta avançar, fazer-se de desentendido, custará muito caro à esquerda, ao Lula, ao PT e a todo o movimento social e progressista do país.

 

Talvez não seja esse o caminho inevitável da conciliação, da frente amplíssima onde cabe todos pelo Brasil?  As primeiras posições tomadas mais de fundo, nos dão uma estimativa muito favorável a esse encaminhamento. O voto na ONU ao lado da OTAN foi uma mudança em 180º naquilo que Lula tinha de melhor, em suas posições anti-imperialistas e no combate ao imperialismo de se fazer de vítima para golpear e invadir tudo que é país. Lula era uma voz altiva e ativa na defesa dos povos ameaçados pelo imperialismo. O abandono deste caminho e da efetivação da contra reformas, privatizações, é ao mesmo tempo o distanciamento da luta, do povo, do poder das ruas e do caminho soberano.

Porém, se a liderança de Lula não lhe permitiu virar as costas diante de uma luta para pôr fim a um governo genocida e consagrar a vitória do povo sob a mais corrupta das eleições no país, é porque deve haver motivos ainda a serem perseguidos, do que aqueles simplesmente de administrador de uma meia fome. A criação de novas bases de mobilização e de luta de esquerda, devem ser imediatamente postas em ação, seja para não ter novas surpresas de percurso, tal qual o plano de lutas da CUT para os quatro anos de mandato de Lula, mas também como uma necessidade para trazer o governo para junto da luta e do povo e principalmente dar voz ativa ao setor mais combativo e organizado do proletariado, que sob a crise que se aprofunda, abrirá novas clareiras na luta de classes, inimagináveis para aqueles que só tem esperança no mundo burguês e na sua institucionalidade.

Pela mobilização e luta nas ruas em defesa da Soberania.

Pelo fim da contra reforma trabalhista e previdenciária.

Pela reforma agrária e urbana urgente.

Pela imediata reestatização da Petrobrás e Eletrobrás.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.


*



The reCAPTCHA verification period has expired. Please reload the page.